sábado, 25 de fevereiro de 2012

Um post (des)esperado

Vinha eu, noite fora, de transportar umas tralhas de uma terreola perto de Viseu, conduzindo a minha velha carrinha pelo sinuoso e perigoso traçado do IP3, quando, perdido nos faróis dos que comigo se cruzavam e olhando as escarpas do ancestral Mondego, me deixei perder por outras visões bem mais satisfatórias e que me ajudam a suportar as agruras da vida. O sonho é o melhor remédio para quem passa mal.
Ora me passeava por paisagens paradisíacas, com praias de areia branca e coqueiros desleixados sobre um mar límpido, ora me enrolava com a Scarlett Johansson num berço de lençóis brancos, algures num motel de Las Vegas, depois de termos saltado de mesa em mesa num daqueles gigantescos casinos da capital do Nevada.
Estes sonhos são perigosos porque me deixam cegueta para a condução e a todo o instante posso resvalar para a berma e, pronto, lá se vai mais um palhaço. Sim, porque os ceguetas, sobretudo os assumidos, são mesmo um bocado apalhaçados.
Mas o verdadeiro problema dos ceguetas, como eu, é que não são verdadeiros cegos. Os tipos vêem, tal como eu vejo a estrada, não querem é acreditar que vêem e, portanto, fantasiam a realidade. Claro, fantasiamos para onde nos dá interesse, porque isto dos desinteressados é conversa fiada como toda a gente sabe. A mim, como vos disse, foge-me para as praias tropicais e para as moças jeitosas; mas não adianta esconder que há quem pense mais no vil metal, sob a forma de ordenado, avença ou outra forma qualquer, ou, quiçá, na pose vaidosa e sabidola, mas eu, como me diz a minha mãe, não tenho do que me envaidecer e tenho uma inclinação para as coisas espirituosas. Pago duro por ter este temperamento mas, como vos tinha já dito, sou feliz.
Bom, mas voltemos à minha viagem. Vinha eu naquele sonho enternecido com a  carrinha já a sair berma fora, quando, de repente, fui despertado pela luz de um TIR que me acordou, impedindo-me, no último momento, de cair por uma ravina tenebrosa. Soltei, claro, um “uf” de alívio. Uf! Agora, amigos, já acredito na luz!

PS: Garanto-vos que escrevi este post sem o patrocínio de qualquer agência de viagens ou de turismo, sem apoios de casino algum de Las Vegas e que a Scarlett Johansson desconhece em absoluto as fantasias que tenho com ela. Também não sou sócio da ACAPO e só por mera coincidência falo em ceguetas.





quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A pevide

A senhora das pevides já quase não borda; a Maria agora é a sua vida. Não que a vendedora de pevides, tremoços e cajus do Bairro Novo procure alienar-se com o cor-de-rosa da revista de coração, nada disso, a realidade luminosa do Picadeiro basta-lhe, preenche-a: a calçada está limpinha, sem pegadas chatas de clientes; o petinga destila charme, veste bem, cheira bem, é um aristocrata não um pedinte; os drogados fogem para o lado do Nicola, a Senhora mal vê a vagabundagem, o Piza Hut e casino; aliás, para ela só temos Nicola, Páteo das Galinhas, Parque-Cine, orquestras no Casino Oceano, garraiadas infantis, burguesia, espanhóis, refugiados, etc; porque será, então, que o glamour das vedetas tv da revista Maria são a vida da senhora das pevides?! Não lhe basta este irreal Bairro Novo vintage dos anos 50 e 60, que ela, aliás, jura ainda existir?! Não faz sentido julgar a sanidade da senhora ou dos figueirenses; continuamos a viver na glória passada, é uma entropia para encarar este presente: picadeiro deserto no inverno e a meio gás no verão, sempre com o Petinga a comandar os aristocratas restantes... Mas não podemos fazer nada para reanimar o Bairro Novo?! Insuflar vida ao moribundo, chicotear o morto-vivo, ressuscitar o nobre patriotismo “bairro-novense”? Podemos, mas antes sigamos para o Jumbo; o glamour da fast food bate, de longe, a pevide da senhora; só falta o petinga...     


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O director

Querem ler uma gracinha travestida de liberdade poética? “Fui convidado para o cargo de director da revista Maria mas não aceitei pois não me iria sentir plenamente realizado; é que o meu sangue só ferve quando carrego móveis e pianos...”. Claro que se trata apenas de um sonho, uma vez que a Maria é demasiado sofisticada para mim... Na verdade, nem sequer sou jornalista, o meu ganha pão está no comércio de arte e antiguidades, ou seja, nunca faltam pianos, móveis e outros carregamentos... Se um homem é considerado pela sua condição profissional, então sou um simples comerciante e carregador de pianos; se um ser humano é considerado pela sua personalidade, então peço-vos que sigam a minha escrita: inteiramente livre, nunca condicionada por algum interesse privado ou político, apenas pela fruição da palavra.
Serve este intróito para vos falar do director do semanário O Figueirense, Joaquim Gil. Perguntarão de imediato: “mas tem algum interesse escrever sobre um irrelevante director de um jornal local?!” (há quem alvitre tratar-se de um boletim de uma empresa, mas passemos à frente). De facto, não tem; mas reparem no seguinte: a publicação (assim evitamos considerações) é dirigida por Joaquim Gil, ilustre advogado da praça coimbrã! Mas, dirão, pouco importa uma licenciatura em jornalismo, o que importa é que o director tenha tarimba nas funções de jornalista, que conheça a redacção de um jornal a fundo e a realidade social do concelho; infelizmente, a experiência jornalística passada do director Gil resume-se a uns artigos de opinião publicados na imprensa local e o conhecimento social do concelho…, bom, se o concelho fosse a mesa onde lança, sempre em “boa” companhia, alguns empertigados perdigotos... Mas pronto, enfim, nos tempos que correm, qualquer um pode ser tanta coisa...
Mas façamos como escrevi no intróito: “se um ser humano é considerado pela sua personalidade, então peço-vos que sigam” a escrita de Joaquim Gil. Antes, uma nota histórica prévia: o semanário O Figueirense pertence ao Casino da Figueira e foi dirigido durante largos anos por António Jorge Lé, também funcionário do Casino. Jorge Lé raramente tomava posições políticas e, por isso, foi com agrado que assistimos à ascensão de um director interveniente e opinativo como Gil na actual fase política da Figueira da Foz. O problema é que Joaquim Gil prometeu ser isento e equidistante, e o resultado foi este: Joaquim Gil malha semanalmente nos mesmos, nunca nos “outros”! Pior que isto, é que basta ler O Figueirense e ter um pouquinho de honestidade intelectual para concluir o seguinte: Joaquim Gil segue a agenda política e os interesses de uma facção do PSD... E, mais grave, Gil tem algumas “espinhas” (invejinhas) engaioladas no seu sótão, às quais recorre amiúde para fazer uma qualquer catarse. 
Apesar da promessa, ainda valerá a pena seguir a escrita de Joaquim Gil? Recordar, por exemplo, um editorial recentemente publicado, intitulado “Os Jovens Turcos”, onde Gil, para atacar a maioria, sugeria que só quem não tem “modo de vida” é que enveredava pela política, pois só o fazem os que são atraídos pelas “prebendas da coisa pública”. Então, João Ataíde não é Juiz de profissão, Monteiro e Tavares não são professores de carreira e Isabel Cardoso não é técnica superior do Estado?! E não é verdade que João Ataíde perde mensalmente centenas de euros de renumeração, por ter trocado o ordenado de Juiz pelo de Presidente da Câmara?! Enfim, ataque-se politicamente as ideias e as medidas e, se for caso, as pessoas, mas com verdade.
Esta é outra faceta de Gil: a mentira insidiosa, a suspeição clara de quem atira a pedra e esconde a mão, enfim, o exercício da menos nobre das qualidades humanas: a pequena hipocrisia.
Uma última nota: recentemente, um amigo meu quis responder a uma inverdade que Gil escreveu num seu editorial e o director de O Figueirense recusou-se a publicar a resposta, ou seja, censurou o texto em causa...!
O que se pode escrever mais perante tudo isto?! Não é um fado triste haver um semanário da cidade que pouco mais é do que um boletim publicitário ao serviço dos interesses comerciais e políticos do Casino e de uma facção partidária?!
Não é muito triste, um director de jornal censurar textos que contêm respostas que lhe são incómodas?!
Meus amigos, ainda bem que o meu “modo de vida” é outro: carrego móveis e pianos sem mais nenhum interesse que não seja tão igual ao do honesto padeiro de Adam Smith que, ao fazer o bem a si próprio, o fazia também aos outros.
Sinto-me plenamente realizado assim, o meu sangue até ferve quando carrego pianos; será que Joaquim Gil alguma vez vai sentir o mesmo, apesar de nos revelar que é feliz?
Duvido.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O pardal

Sabiam que no E.Leclerc vive um pardalito? É um pardal, igual a tantos outros, mas figueirense, desmesuradamente esperto, de tal maneira que se refugiou logo na zona dos congelados; como sabem, qualquer ave concelhia tem sempre de fugir do calor “inigualável” da praia da claridade. Adiante. O pardal voa no paraíso E.Leclerc sem freio, receio ou preocupação, a catita ave é livre, totalmente livre, não espera um “amanhã que cante”, nada, só deseja debicar sem cessar os produtos guia, aqueles com 50% de desconto em cartão; é claro que quem vai poupando assim é feliz, não almeja mais nada, nem sequer repara na moça da charcutaria, a do turno da noite: formas generosas, paio fresco a toda a hora, soldo miserável por 12 horas de jornada solitária; será que o passarito algum dia vai reparar na moça? E que a moça vai algum dia melhorar a sua existência, quiça, ser por breves momentos um pássaro livre, totalmente livre, sem precisar de um “amanhã que cante”?! Não faço ideia como acabará a história, o mais certo é o pardal debicar o paio nobre da moça e ser enxotado de vez... O que acham desta “estorinha”? Edificante, moralizadora, redentora?! Eu acho-a muito piegas; não é só Passos Coelho que pode utilizar tão nobre adjectivo. Parece que o Primeiro Ministro acha que os portugueses são piegas e eu concordo com ele, não parámos de choramingar desde que ele tomou posse; Passos Coelho pensa que estamos agarrados a tradições caducas como o carnaval e eu concordo com ele, há quase um ano que dura o seu reinado. Mas paremos de vez com a catarse colectiva de comentar as idiotias de Passos Coelho ou Cavaco Silva! Falemos de coisas sérias, elevadas, importantes para o futuro da nação; sabiam que o Paulo Futre não vai pôr os pés no carnaval da figueira, na terça-feira?! Estou chocado! Só admito perdoar o rei do corso se ele me arranjar um emprego; é que Futre agora arranja empregos no programa dele, na tvi24. Já advinharam o que pedi ao astro da bola? Um emprego no E.Leclerc, junto à charcutaria, desde que o raio do pardal deixe o paio da moça...