Curiosamente, a tirada de Jesus, um purista da
palavra, surge num momento em que no meu espírito se adensa uma dúvida: será
que Portugal se finou?
Recorde-se que, rapidamente, Portugal passou de
Condado a reino independente, pátria a nação gloriosa; o povo eleito por Deus
para espalhar a palavra do Senhor através da epopeia dos Descobrimentos.
Refira-se que este irrealismo, a imagem exaltada que temos de nós próprios, é
uma constante na historiografia e literatura nacional: para além dos Lusíadas,
temos o sapateiro Bandarra e as suas profecias de um reino universal liderado
pelo embuçado; o milenarismo do Padre António Vieira com Portugal senhor de um
Quinto Império; o genial propagandista do sebastianismo D. João de Castro
(1550-1628) ou o místico Fernando Pessoa da Mensagem...
Reparem: todo este nacionalismo sebástico ressurgiu
periódicamente ao longo da história; quando os ingleses, em 1890, aprovaram o
Ultimatum e Portugal teve que abandonar parte do seu “império” africano,
ocorreu um tumulto nacional, com Antero de Quental, Guerra Junqueiro, Eça de
Queiroz ou Fialho de Almeida, a acusarem o governo e a monarquia de cobardia e
de permitirem a humilhação nacional; na altura, Silva Porto, um comerciante e
explorador do interior africano, imolou-se envolto numa bandeira portuguesa...
A jacobina primeira república apresentou-se como uma
simbiose entre valores patrióticos e populares, basta atentar na A Portuguesa;
a república autoritária de Salazar, essa, resumia-se ao “tudo pela nação, nada
contra a nação”; veio o 25 de Abril e o fim do império que restava, e o que
tivemos?
Para além do saudosismo da glória perdida, vimos no
projecto da Comunidade Europeia a hipótese de reconstituir um novo império;
recordam-se do Primeiro-Ministro Cavaco Silva, nos anos 90, a garantir que
Portugal seguia no “pelotão da frente” da Europa?
Julgo que a crise económica de 2008 colocou a nu o fim
da narrativa sebástica: Portugal não é mais um povo destinado à glória, antes
uma pequena nação, pobre, endividada, falida. Pior: o nosso Primeiro-Ministro
chama-se Angela Merkel...
Mas será que temos a consciência que a pátria se
finou?!
Não sei, talvez os portugueses continuem a
identificar-se com Jorge Jesus: “Eu quero ser feliz por aquilo que é o Benfica
hoje”.