Num
cemitério, em qualquer cemitério, as palavras do poeta John Donne perseguem-me,
repetem-se no meu espírito: “Nenhum homem é uma ilha isolada, cada homem é uma
partícula do continente, uma parte do todo; se um torrão é arrastado pelo mar,
a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos
teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou
parte do género humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles
dobram por ti”.
Ernest
Hemingway usou-as em 1940, quando editou o brilhante “Por Quem os Sinos
Dobram”, mas elas, as palavras, não se dobram perante o cortejo de campas,
sepulcros, lajes e lápides do Cemitério Oriental da Figueira da Foz. Quando
leio, numa lápide de um defunto que não conheço, a emocionada inscrição:
“Eterna saudade dos seus filhos”, nem reparo que a campa se encontra totalmente
abandonada... Que importância tem vislumbrar uma sepultura abandonada?
Regressam de imediato as palavras de John Donne: “Nenhum homem é uma ilha
isolada, cada homem é uma partícula do continente, uma parte do todo...”.
Mas,
pesarosamente, o todo assemelha-se a um “torrão arrastado pelo mar”... A
existência segue sem propósito nem sentido, e o discurso público e político
atingiu a inanidade total. Como construir um discurso sobre o país e a Europa
se somos diariamente bombardeados por sound bites, demagogia e mentiras? Todos
nos escondem a cruel realidade do definhamento da Europa, sem riqueza
suficiente para manter o estado providência do pós-guerra; no fundo, acabou o
que distinguia a Europa como farol de liberdade, igualdade, direitos humanos e
estado de bem estar; pior, explicam-nos a realidade através de uma ficção onde
a esquerda e a direita subsistem, o muro de Berlim permanece de pé e o século
XX ainda vai a meio...
A Europa tem
que reinventar-se e deitar abaixo um sistema baseado no consumismo desenfreado,
que leva os bancos a acumularem um poder desmesurado e anti-democrático.
Ninguém sabe como realizar esta revolução, nem há um lider ou tropas
disponíveis para avançar; importava, pelo menos, que os europeus conhecessem a
verdade e que percebessem que “se um torrão é arrastado pelo mar, a Europa fica
diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos
ou a tua própria”.
A culpa do
que aconteceu ao velho continente e a Portugal não está só nos outros, no papão
dos bancos, Troika, FMI, Comissão Europeia, José Sócrates ou Passos Coelho; a
realidade apresenta-se mediocre, incompetente e corrupta porque todos nós somos
“uma parte do todo”, “cada homem é uma partícula do continente”.
“E por isso
não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”!